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quarta-feira, 27 de abril de 2011

Janelas




não foi sonâmbula que eu te vi, oh Deus
uma estátua em pátina num altar quebrado
foi numa tarde morna entre as brumas do mar
em frente a minha casa

nem foi nos livros ou nas palavras
compactadas dos versículos
foi porque sopravas no ar de mim tão perto
eras quase corpóreo:
-trouxe-te aqui para falar contigo.

combinamos coisas diversas,
de um lado, que eu tivesse calma
de outro tu enches-me de esperança

o mar estava calmo
as pessoas se divertiam.
na paisagem a minha frente
várias Janelas se abriam
Apresentando-me o futuro.

Julia Lemos

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Toca a Rufar



hoje os tambores estão a rufar
e o fogo de artifício
relembra
vitórias e fracassos
de um cravo murcho
nação que já não canta
e corpos dançantes ao som
de um Jorge Palma Frágil
é prenúncio de que
ainda pouco nos tiraram
da liberdade de falar
os anos incertos
e canudos guardados
na rua dos desocupados
estão prestes a terminar
"à que ter esperança", dizem alguns
em vila morena
bifanas e farturas
ordenam esta noite
nada falta
excepto delícias de um cravo no bolso
e a herança do povo Coragem
num dia eterno de Primavera.




NAF
25/04/2011

sexta-feira, 22 de abril de 2011

ANASTASIS



"Vamos ressuscitados, colher flores!"
Miguel Torga, in “Convite”

Madrugada
primeiro dia do sábado
dia de resgatar o jardim
de revelar as pérolas
de dentro do mundo da concha

dia de colheres flores,
Maria Madalena,
e de anunciares aos irmãos,
ainda dormentes
nos seios da noite

que deixem de indagar
o estridor do oceano
no pavilhão dos búzios
e céleres acorram à cripta
que despojada está da sua missão
de para sempre dissimular à vista
a carne rubra da rosa

pois a esperança foi finalmente
engrinaldada

diz-lhes que a pedra se moveu
e a sepultura deu rediviva
o que não tinha cadeias para agrilhoar

leva-lhes esta flor
em que a seiva livre de novo corre
diz-lhes que é perene
o seu perfume que à sua cor
até o sol e a lua murcham

diz aos irmãos, a Pedro a João
e aos demais
que o Mestre vive


Rui Miguel Duarte
25/03/10

terça-feira, 19 de abril de 2011

FERIDA




“Espera-O uma coroa de espinhos
Para secar o sangue sobre a fronte, espera-o
a fome de um chicote
que as costas lhe há-de devorar”
J. T. Parreira em “No Jardim do Getsemani”

A fome batia uma litania
vai e vem sobre o dorso como tambor

O látego batia em sintonia
com a contagem ritmada
da voz do decurião
uma, duas, três, até quarenta
e com os gritos
de dor do condenado

E latejava as nossas cabeças
dentro de cada dentada das fauces
do chicote estampido vai e vem

Acirrámos os dentes
em aprovação do castigo
e dos gritos do condenado
as costas devoradas
as gotas de sangue salientes
eram o nosso prazer e satírico canto

Mas não deixávamos de pensar
que a obra do carrasco
devia ficar na discrição
recôndita duma caserna romana
longe da vista e do coração
e ensaiámos apartar o olhar
desviá-lo do esbatimento do seu rosto
em busca da geometria da dança
de um bando de pássaros que por ali voasse
ou admirar as coríntias colunatas do pátio
onde decorria o evento

Mais tarde esperava-o uma coroa
sobre a cabeça de espinhos
para o sangue na fronte lhe secar

E escorria das nossas cabeças

E depois ainda
esperava-o ser fixado na cruz
poucos de nós ficaram para ver
preferimos meter-nos pelas cruzes das ruas
pés apressados para o recolhimento e a piedade
pois esperava-nos a Pesach em casa
ao lume do assado do cordeiro,
o único a quem hoje se devia secar o sangue

Mas o vai e vem do flagelo batia em nós
e a voz de comando do decurião e os gritos de dor
o sangue porfiava em correr de nós
como mulheres nos dias da impureza
os panos não o estancavam
banhámo-nos mas a água
solidária tingia-se de escarlate

O chicote a coroa a voz do decurião e o sangue éramos
[nós
o que tínhamos nós com esse contumaz blasfemo
de rosto deformado condenado?

Caímos no chão

Éramos nós os condenados
de costas devoradas e frontes sangradas
à beira do vale onde a morte se dissimula de sombra

Por fim acordámos

Esse sangue
penetrava-nos até aos corações
e corria agora neles
lavados



Rui Miguel Duarte
17/10/09

Pintura em Azulejo de Carla Branco







NEGAÇÃO


“Olha Pedro, avisou-o Jesus, não cantará hoje o galo sem que me tenhas negado três vezes"


Evangelho de Lucas 22:34 (versão A Bíblia para todos, p. 2094)





Antes de o galo acordar o sol

antes mesmo de a aurora multiplicar rosas
ouvir-se-á o murmúrio das vozes
no pátio
e ao vento uma palavra não soprada

O coração esconderá a vergonha
lançá-la-á ao crepitar da fogueira
acesa para aquecer corpos
consumir fadigas e tristezas
mas o ardor de um coração culpado
fogo nenhum extingue
antes mais o inflama

O seu rosto será familiar
cuspido e escarrado
alguém o terá visto
o braço direito desse Rei

E ao vento uma palavra não balbuciada

Sentados na roda dos coscuvilheiros,
os olhos mirarão o homem
de fronte suada de desassossego e fuga
As vozes certificarão o que ele preferirá ignorar
terá sido um desses que terão partilhado a mesa com o
[Galileu
e que tentará então com a aba do manto
manter o anonimato

As vozes darão carne à sombra que ele ansiará
por abandonar numa esquina

Mas fugirá o descanso desse coração incerto
pois ao vento uma palavra NÃO será protestada

E será este protesto quem acordará o galo,
que então se lembrará que será a hora

Outros olhos então pousarão nos seus
os olhos condoídos do Mestre
que lhe atravessarão a couraça da alma

E na esquina onde se quis esquecer
será aquela em que se reencontrará
no espelho das lágrimas: ainda que a voz minta
estas só sabem dizer a verdade
e desconhecem a palavra
NÃO




Rui Miguel Duarte
20/11/09

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Mar Prepotente



Sentir o aroma das flores
flutuar nesse Mar Prepotente
pasmar-me com lindas cores
de um arco-iris surgido um dia
ora molhado, ora quente
presenciar a aurora a despontar
acordando vagarosa
sob o teu atento olhar
leva-me a acreditar
que o teu amor irradia
sempre, sem cessar
na harmonia de cada dia
completado pela tua graça
onde minha alma se enlaça
com tão bela criação
desenhada por Tuas mãos
Teresa Fulgêncio
04/2011

sábado, 16 de abril de 2011

Amor para Sempre

(A Jesus Cristo)

Quem me separa desse amor?
Seria tristeza beleza ou vertigem
o sono a ignorância o impasse a desilusão?
Não, esse amor é muito grande
Seriam as perseguições ou a falsa paz,
os sorrisos sem graça
os mendigos na praça a saudade a dor e a fome...
Não, nem as cadeias que me envolvem
nem os ventos que assopram
poderiam me separar deste amor tão grande

Nem os píncipados nem a espada empunhada
nem a insônia de madrugada me banirão deste amor,
me desprenderão de tuas mãos.

Julia Lemos
15/04/2011

quinta-feira, 14 de abril de 2011

para ser gente

eu,
sou livre mas não sou meu

mas de todos
aos que caminham
ao meu lado

dos que me amam
com abraços apertados
sem algemas

gosto de voar
entrar e sair
sair e entrar
sem medo de perder o norte
ou a bandeira

e de ser parte
de uma comunidade significativa
embora criticável

onde não há grego nem judeu
bárbaro cita servo ou livre
ausente ou congregado
fiel ou desviado

onde todos se incluem
e deixam de ser apenas homens
e mulheres
para ser gente

eu,
sou livre mas não sou meu

(mar) 14/04/11

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Marcas Recentes



sou viajante
no amplo espaço
de um vazio
incompleto de Mim

encontro-Te pela manhã
e um bando de pássaros
vem pousar-me na cabeça

mais um dia
em que não posso voar
as asas que me ofereceste
foram cortadas

e da relojoaria do lado levaram tudo
esta noite
três filhos para criar
e ladrões à solta

tento alcançar
marcas recentes
no trânsito dos pensamentos
de esperança

mas tudo está igual
retira-se aos que honram o ofício
e o proveito é grande entre
os que desgovernam

e qualquer dia vamos todos a pé para Lisboa
para a refeição diária no refeitório dos anjos de rua

e o deleite nas terras altas
é dificultado para os corajosos
sem medo das alturas

murmúrios surdos e vozes no vento
confirmam-se dependentes
da televisão
e misérias humanas

um dia
vais-me sentar no Teu colo
e me responderás a todas as perguntas

mas isso pode esperar
quero sentir o sabor da vida
e acolher a doce ilusão de que tudo vai bem

encontro-Te pela manhã
e vou voar nas Tuas asas
as Tuas jamais serão cortadas.

Adelaide Figueiredo
11/04/2011

sábado, 9 de abril de 2011

ORAÇÃO DE ENTREGA

Deus, o Senhor me deu um corpo,
Com ele eu caminho, danço, abraço
Sinto o amor das pessoas totalmente
Te agradeço por teu cuidado

O Senhor colocou em mim o pensar
A capacidade e o direito de decidir
Sou um ser emocional, sofro, acho graça
Consigo ser feliz, obrigada meu Pai

Tenho também um espírito, que ouve o Teu
Ele me leva pra perto de Ti e me ensinas
Sei que sou Tua filha por Tua presença em mim
Obrigada Paizinho, por Tua misericórdia

Por tudo isso eu sei que não sou somente
Uma parte de mim que está doente
Sou todo o mais, eu sou completa.

Se tiver que te entregar algum pedaço, que seja
Entrego-te sem murmurar, o Senhor me deu,
Eu sei que tudo o que tenho e sou é Teu.

Sandra Botelho

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Ela



Há um grito incontido
ecoa de dentro
da alma sedenta
Vê?
É uma mulher
Ocupada, cansada
Entre riso e pranto
Trabalho árduo
e acalanto
Lá vai ela
Plebeia...
As vezes no palco
As vezes plateia...
Lá vai ela
Princesa
As vezes
Criança indefesa
Outras valente
Indo em frente
Sem cajado na mão
E quase sempre
Conduzindo a nação.

Lá vai ela
Não cala o grito
Incontido
Afinal é princesa
Pertence a realeza
É filha do Rei
Mexe nos cabelos
Arranja o vestido
E vai
Seja no palco
Ou na plateia
Enfrenta vida
Sua odisseia
Semeando
por onde passa
Perfume, amor
E Azaleias…

Arlete Castro

Revoluções Interiores



De manhã
ao acordar
tento encontrar-Te
nas pequenas coisas
respiro o canto dos pássaros,
e voo em liberdade
na alma do silêncio

procuro ficar atenta
a coisa nenhuma
atenta
atenta
de olhos fechados
e os alicerces da minha existência
são abalados

o dilema está latente
nada funciona
fora do cosmos,
calibrado ao pormenor
pelas Tuas mãos

a essência ínfima do eu
é salpicada de sons coloridos
e todas as revoluções interiores
ao estilo de Napoleão
mas a Tua paz me cerca

“Não lhe dês ouvidos”, escuto
e nos minutos seguintes
é expresso o Teu amor na tela
e crias arte em todas as coisas

firmes são as Tuas fundações
Oh arquitecto da vida!
expiras teu saber na criação
fomentando os Teus sonhos
Na humanidade.

Adelaide Figueiredo
06/04/2011

terça-feira, 5 de abril de 2011

Paraíso



Prometeste-me um lugar
construíste uma ponte pra mim
deste-me de ti
seguraste a minha mão
Amaste-me

Mas naquela hora
o sol deixou de brilhar
um véu se rasgou por inteiro
e para quem via
parecia que era o fim

e tu já não estavas
o seu rosto cansado,
suado, abatido
já não olhava para mim

Mas não!
lembras-te quando
falaste do pão, da vida,
e do paraíso sem fim?

Acreditei.
e agora o que faço sem ti
o que faço com esta dor
que teima em me queimar o peito

Onde estão as moradas que
preparaste, onde estão as
palavras que me ensinaste
onde está o homem que eu amei?

neguei-te e agora?
já nem sei quem sou!
uma lágrima rolou e eu calei
andei sem rumo,
quis voltar pra casa
mas eu já não tinha lugar
eu já não era daqui.

Mas num momento um sussurro
chega até mim
luz intensa que não consigo atingir
não estou só há mais alguém
alguém que fez a ponte para mim
Vejo, céu, vejo a glória,
Vejo o paraíso enfim.

Arlete Castro
04/2011

Cânticos na noite



Cântigos na noite
só Deus os pode dar
e dá, eu já o provei
e mais tenho provado

pois Ele é o meu cântigo
e a minha alegria
Ele é o mesmo se é noite
Ele é o mesmo se é de dia, porquê?
Ele não pode mudar
porque é Fiel a si próprio.

Emília Cruz
04/2011

Alentejo



Ao percorrer o Alentejo
do interior ao litoral
vejo nas gentes desejo
de muita paz afinal

sinto no meu interior
pessoas á procura
de Jesus nosso Senhor
para sua paz e cura

por mais que possa correr
a medicina e meditação
só encontrei realmente paz
com Jesus no coração

pois com suas promessas
mensagens e ensinamentos
te dará assim que o peças
Paz a qualquer dos momentos.

Vitor Chicau
5/4/2011

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Águas



Há esperança nas muitas águas
Elas fluem como rios
Rios de Água viva,
Água que abençoa, que sara


Há promessas nas muitas águas
Porque são fonte de vida
De sede saciada
De unção


Há cura nas muitas águas
Porque elas trazem consigo o bálsamo
Que afugenta a dor e restaura o coração


Há certezas nas muitas águas
Porque elas nascem do trono de Deus
E jorram abundantes, incessantes...
Guiando os caminhos meus.


São o próprio Deus as muitas águas
Pleno, presente, atuante, real...


(baseado em João capitulo 4)


Arlete Castro

domingo, 3 de abril de 2011

Não Temas

"Não temas" dizes-me
e o vale de ossos secos
se dissipa
e deixas-me apenas
Os sonhos
outrora perdidos
envoltos numa cruz
do Teu olhar retenho o mundo inteiro
e desprendo-me da Vida antes firme
que loucura!
caminho numa estrada sem retorno Junto a Ti
embrenho-me na graça
Admirável!
Complacente!
mergulho nos teus braços
e ensaio palavras harmónicas
Preces decoradas para Te oferecer
Graças! Porque à revelia da Torre de Babel não me entregaste
e dispensas todos os acessórios humanos
apenas lágrimas e risos despropositados Te consigo oferecer
A religião é um fardo!
e o meu coração se abre para Ti
nada mais
nada mais
"Não temas" dizes-me
E quando confio o sol brilha
e deslumbro de novo um horizonte lúcido e infinito.

Adelaide Figueiredo
03/04/2011

sábado, 2 de abril de 2011

É nas Flores

As flores
ensinam
Teu cuidado
elas segredam ao ouvido
e dizem
que Tu és simples
protector
generoso
as flores
com seus diversos odores
tamanhos
e cores
são todas
amadas
e a raíz
por Ti fortalecida
não são olhados
por Ti
os gostos de uma flor
nem para que lado se inclina ao cair do sol
nem tidos em conta
os espinhos que liberta
ao se defender
nem as folhas que caem
quando se renova
ao deixar a abelha
levar um pouco de si
ela sente que está viva
e procurando todo o dia
o beija flor e a borboleta
para namorá-la
então, ela sabe que é amada!

Neusa Figueiredo
02/04/2011

Terra mãe...


Deitada em ti, minh'alma adormeceu.
Indaguei de ti, se tens coração...
Contaste segredos de como Deus te deu
uma tão longa vida e tão grande missão.

Falas de paixão por esse Deus criador,
que te abriu as entranhas e te fez verde e mar.
Que te concebeu para te dares em Amor
e de ti fez Adão para te cuidar.

Fico assim enlevada em teu manto materno;
esquecida de mim tudo aqui é eterno.
Respiro o teu chão e sinto-me bem.

O teu coração latejando de Amor...
Ouço um sussurro em constante louvor;
esperas por Ele, pois sabes que vem.

Ana Bela Alegre.
15/1/11

Monção

"O meu amado desceu ao seu jardim
aos canteiros de bálsamo, para se
alimentar nos jardins e para colher
os lírios.
Eu sou do meu amado, e o meu amado
é meu; ele se alimenta entre os lírios."
(Cantares 6:2-3)



Senhor
chamas-me jardim
sendo eu deserto árido?

Tu és soberano
permite que em Ti os meus lírios
saciem a sede de que padecem
o canteiro brotará odores coloridos
será renovo ao som das águas
tempo de monção anunciada virá
e dás o fôlego de amor
trazendo-me à vida

chamas-me pelo nome
que me deste e me acolhes
à Tua formosura
o amanhã esse, é somente Teu
os canteiros de lírios
de que Tu te alimentas
estão ansiando por Ti
então sei, é tempo de nova colheita

Tu és meu, eu sou tua.

Neusa Figueiredo
(02/04/2011)

um Deus irreversível


"Ainda que eu ande
pelo vale da sombra da morte
não temerei
porque Tu estás comigo."
(Salmo 23:4)

esta noite
as aves
já estão recolhidas
preparando o amanhã dos ninhos
onde gentilmente
defendem os filhos

dormitam nas árvores
sob a atenção da vigília
dos meus olhos
suspensos
aprendendo
o permanente

esperando as bênçãos
prometidas
de um Deus irreversível

as certezas
das aves silenciadas
deixam-me confiante
e deleito-me docemente
no salmo vinte e três

reponho mais uma vez
no coração
os níveis necessários
de verdes pastos
e de águas tranquilas
em justiça

as certezas de hoje
preparam o amanhã
sem sobressaltos

(mar) 06/02/11